20 de novembro de 2007

Sob o meu travesseiro

Esse vento de agora, que vem anunciando a mudança do clima, não é um sussurro, tampouco um assobio. Vem gritando as almas caladas da cidade, vem chorando os prantos escondidos guardados sob os travesseiros. Talvez seja o choro de nós todos jogado ao mar aumentando o nível da água e fazendo afogar a Holanda.
Faz-me lembrar tanto daquele dia em que ouvi sua voz e veio em mim algo maior que essa saudade e esse mar. A engolfada louca de tudo que não é palpável, mas palpável foi a gota quente que parou ao desnível da bochecha quando o corpo, louco, interpretou a expressão de dor-amor perdida como um sorriso, e fez desenhar no lado do rosto a espetada da agulha que eu sentia no peito. E por esses dias fiquei pensando em ti e na vastidão do seu significado e na vastidão da sua ausência e na vastidão que você é e na vastidão dos seus sentimentos e na vastidão dos meus. E pensei na sua falta. Racionalmente (o que não tem como significar 'sem sentimento', mas tem como significar 'sem desespero'), pensei na sua falta. No significado da presença e no significado desse espaço vazio, desse número sem corpo na agenda do celular, dessa fresta por onde passa o ar frio que seus dedos tão finos conseguiam reter mesmo que eu estivesse num lugar aberto por todos os lados. E tenho duas mãos cheias de lembranças de expressões, e do prazer da sua risada, e das suas mãos de cartas, de cerveja, de cigarro, de mim. E tenho uma mão cheia do medo de parecer eloqüente demais, insistente demais, sozinha demais, dependente demais, cansada demais, ausente demais, esperançosa demais, medrosa demais.
Mas de você, de você não tenho medo. Tenho aquela mesma curiosidade de que lhe falei um dia. E de que cor você é? Vejo-te vermelha, como as palavras pequenas tão grandes que vejo na tela iluminada demais. Como eu, demais. Vejo-te amarela, como as mesas do bar no qual anseio ver-te sentada de novo, rindo de novo, jogando de novo, falando de novo, e olhando indignada de novo pro meu copo de refrigerante. Vejo-te azul da cor do mar, do mar que logo cruzo para voltar. Vejo-te rosa, como a cor vibrante da sua camisa. Vejo-te branca, do branco da sua pele, de você por fora. Vejo-te vinho, roxo ou qualquer outra cor intensa, como você é por dentro.
Chorei quando ouvi você dizer da iminência do seu choro, sem saber anunciando o meu. Chorei de sentir você tão louca, tão grande, tão presente em mim. E quero chorar agora. Porque você é muito, e muito é o que você é e seria noutro canto, mesmo que eu nunca tivesse visto o seu rosto. E grande você é mesmo que eu a veja pela mente e por fotos e sinta sua intensidade evasiva e invasiva sempre em mim, nos outros, em todo o resto. Sinto sua falta tanto. Tanto, tanto. Estou tanto eloqüente, tão latente, tão.
Você é muito, é tanto. É bonita como a ausência de poesia que vê nas coisas, é bonita como a presença de poesia que vejo nas coisas. É bonita como a ausência de palavras que me toma quando a boca já está aberta, e bonita como a presença de palavras que encontro na hora de dormir. É bonita como a ausência de explicação, e como a presença de entendimento. Como a ausência de você, e a presença mais ainda.

3 comentários:

  1. Ai, menina, que post lindo. Eu li e cheguei ao final pesada, como que ocupada por toda a ausência de que você falou. Há um trecho d'O Jogo da Amarelinha, do Cortázar, que também lembrei, porque o ex adorava o livro e citava sempre, rs: "Nenhuma razão para pena. Esteja ela onde estiver, tem o cabelo incandescente como uma torre, queimando-me de longe, fazendo-me em pedaços apenas por sua ausência."

    Força sempre, menina.

    Ah sim, e obrigada pelo seu texto no meu blog. Fez toda a diferença.

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  2. Muito.
    Bonita, sempre. Muito.

    Amovocê.

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