24 de março de 2008

Sobre o (desa)sossego

Ama-me louco, possessivo, invocado. Arranha as paredes do meu quarto e rasga meus jornais. Espalha minhas fotos e meus espelhos todos pelo chão e pisa com pegadas de sangue meu carpete amarelo, escreve-me cartas e as deixa em cada gaveta do meu armário. Rabisca-se de giz, ostentando ser criança, e pede que o segure nos braços para o amar. Caminha sobre meus cabelos pela noite, sussurrando segredos infantis em meus ouvidos, cantando mistérios que nunca foram, amando-me. Traz-me flores de tarde, chocolates de dia, vinho de noite. Passa a mão em meus cabelos dizendo nunca ter tido tão formidável travesseiro e me beija a boca para que o ache cativante. Conta histórias de ninar para me manter acordada e estraga meus momentos de extrema folia com conversas mentiras do seu tempo de adulto, fazendo-me jamais querer sair de casa. Alisa-me a testa com dedos de almofada e beija minhas bochechas com o nariz, sorrindo. Chama-me nomes no banheiro, rasga-me a boca com a sua, cospe água revoltando a cabeça e só desiste depois do derradeiro grito dos torturados. Depois toma banho, põem as cuecas que lhe dei, a gravata da esposa e volta para casa.

Dilacerações

E matava-me toda vez sempre muito quando sua voz trazia seu choro e ela o reprimia, intimidada pela minha presença no quarto.

20 de março de 2008

Que lindo, não é?

Que me esbarrei um dia com uma senhora a meio caminho de algum compromisso, mesmo asim tão velha ainda algum compromisso, e seu rosto não tinha tanto cansaço quanto o meu.
- Com licença. Olá. Eu comprei essa passagem de ônibus que vale para três viagens, mas só precisei usar duas. Como estou indo embora da cidade dentro de meia hora, não precisarei mais dela. A senhora quer usá-la?
É lógico que sua mão acreditava, pelo jeito que aproximou-se de mim e abriu os dedos para receber o papel ainda bem conservado da passagem comprada há uma hora. Mas ela mantinha nos olhos qualquer expressão de incredulidade que precisava de confirmação.
- É que estou viajando hoje e jogaria a passagem no lixo, mas não sei, talvez a senhora queira usar.
- Sim, sim, obrigada, e sorriu como se eu fosse sua neta.
- Não há de quê. Sorri deixando-lhe o bilhete na mão semi-aberta, indo já atravessar a rua.
- Obrigada, repetiu com aquela voz antiga que te faz crer que todas as pessoas de idade são boas. E como um último desejo para alguém que lhe fez bem -e o bem hoje tão raro é que qualquer boa ação é motivo para votos de eterna felicidade- e que jamais veria novamente, disse: Boa sorte.
E chamou-me atenção que não tivesse ouvido daqueles lábios franzidos o nome de Deus, nem o sino dos anjos, nem ouvido hinos de louvor, nem chuvas de bençãos.
E pareceu-me então finalmente simples que eu não acreditasse em Deus.

13 de março de 2008

É um absurdo e um exagero

É quase um absurdo, é um exagero querer ser tudo isso que não sou. É quase irrelevante e é certamente ridícula a vontade de completar-se. Não que ela seja, em si, ridícula, mas mostra-se apenas inviável, o que lhe é mais conveniente, pois que passa o ridículo a quem a almeja. E a almejo eu por crer na existência de qualquer coisa que se chame plena, qualquer coisa que se chame encontro, e não esqueço, pois que Vanessa grita em mim e para mim que um bom é de dois. Pergunto-lhe, como se ela fosse deus, se não lhe vale um encontro de uma pessoa e meia, de uma pessoa e quatro quintos, de uma pessoa e, eu juro, a intenção da outra. Mas a frase é tão crua que até mesmo Vanessa sofre: um bom encontro é de dois. E me remexo na cama, há tempos que os lençóis não se ajustam ao meu corpo, e me remexo na cama e o sono, quando chega, sonha com coisas que não quero, que nem nunca quis, sinais fingidos de mim que me perderam, e dessa vez não direi “que também eu perdi”. Não direi porque não sou o que eles queriam que eu fosse, e portanto insistem em grudar no meu corpo, mas não têm cola, porque me lavo constantemente dessas necessidades que acham que são as imediatas e não são. Agora, bem, agora basta-me na volta consertar os parafusos soltos e perceber que não há erros, nem grandes lacunas, perceber que as roscas apertam perfeitamente os parafusos e me decepcionar por não faltar nada, há sempre que faltar alguma coisa. É que o vai-e-vem necessário é um gasto das nossas rodas, é um gasto das nossas modas, é um gasto das nossas bossas. É que estar sozinho às vezes alimenta, mas por fim sempre termina por aumentar a fome. Também não sei dosar quantidades de álcool porque não estou acostumada, então não deveria ser surpresa que ela corresse de mim. E ela corre de mim achando que permanece, oh, ironia, e permanece. Sou sempre eu a tola a crer que me faltam pernas ou vontade; geralmente só me falta verdade. Sobram incômodos. Sobram. O quanto me incomodo e o quanto me reviro na cama - e logo voltamos aos lençóis - é absurdo, e ainda constantemente desejo que haja nela alguém que possui nome e formato, e acho que os conheço por conhecer minha vontade de tê-lo. Também eu às vezes penso querer morrer jovem, como símbolo de plenitude e altivez (a morte, não eu), mas não as tenho.

Ele, o tempo e a poça

Jamais havia se sentido tão traído pelo tempo. Havia já perdido amigos, amores, saúde, saudades, a juventude, mas essa sensação de agora, essa sensação desconhecia. Transformado em segunda opção pela ausência de vivência, de experiência, de contato, de descobertas, sentia o tempo passar com demasiada rapidez e cortar-lhee a pele, secar-lhe os olhos para depois os fazer lacrimejar. Como sempre em algum ponto do dia, do mês, da semana, da vida, vinha-lhe o casaço para lhe dizer para ninar as chuteiras no prego ao lado da porta. Nunca havia sucumbido a essa nem a muitas das outras tentações que lhe massageavam os pés. Já agora, achava convidativo. Muito.
Tinha particular asco pelas idas e vindas, principalmente as suas próprias e especialmente quando permacia no mesmo lugar. Seria tão mais fácil, é lógico, tão mais fácil, se fosse racional e menos intempestivo. Mas é que, veja, ser segunda opção sob o pano, disfarçadamente, bater figurinhas e depois devolvê-las no fim do recreio enquanto ninguém vê para que amanhã ainda haja o que se fazer durante o ócio que, pretencioso, chama-se a si mesmo de criativo, ser um suplente assim é viável, é suportável, é até comum e por isso completamente aceitável para a maioria das pessoas - e nesse grupo assinava seu nome. No entanto, ele sabia, ser o segundo melhor não é ser o primeiro, tampouco é ser o último. O último tem a certeza, e por vezes o carinho, de ser o último, e isso lhe conforta. Os do meio costumam morrer. Os do meio devem apenas sorrir. Os do meio devem ser bons, prestativos, eficientes, conscientes. E a consciência é quem mata os suicidas.
Mas para ele, acostumado a uma presença de corpo inteiro, acostumado a ter nos olhos os olhos das outras pessoas, ansiosas por algo seu, para ele agora bastava um. É que sentia em si a necessidade de algo que transcendesse seus olhos e encontrasse algo entre eles e sua nuca, e não achasse que fosse puro entretenimento. Havia nele a necessidade antiga de se fazer pleno em outra alma, que seria como de anjo, despida de sexo, e essa alma, que ele encontrara no banco de concreto sujo da calçada que por acaso era sua preferida, essa alma era vaga, ele descobriu, e para haver o que ele detestava chamar de 'encontro de almas', que na realidade bastaria chamar de 'encontro de necessidades', encontrar reciprocidade plena, sim, quase e provavelmente plena, mesmo que essa palavra o assustasse mais do que deveria, para haver tal encontro seria necessária tamanha reciprocidade que lhe trazia medo apenas imaginá-la. É que havia em sua história outros tombos que lhe haviam dado a sabedoria, que muitos chamariam privação, de não mergulhar de cabeça na primeira poça d'água que encontrasse, e aquela alma que encontrara no calçadão, aquela alma era feita de água, e nela vivia.
E então, como dissemos, aquela alma era vaga e se mostrou solícita e interessada, e mostrou uma reciprocidade de interesses que o assustou, mas que não o fez correr, como talvez esperasse de si mesmo - e por vezes são necessários desapontamentos, para que a vida siga adiante. Considerou, então, mergulhar naquela poça, porque não lhe parecia em hipótese alguma rasa, não, parecia-lhe sim um grande lago e, quando aproximou-se dela para descobrir um pouco mais de suas peculiaridades, viu-se refletido em suas águas espelhadas, nem turvas, nem tampouco límpidas, e foi também isso então que o fez pular: ele bem precisava encontrar a si mesmo.
Passou, então, a nadar quase todos os dias, mas sempre crawl, que fazia tempos que não era dado a essas ousadias infantis e achava melhor precaver-se contra sua falta de habilidade. No entanto, aquelas águas nas quais embrenhava-se e, acreditem, encontrava segurança por mais que descobrisse progressivamente o quão fundas eram, aquelas águas não eram suas, e por vezes haviam de disponibilizarem-se para outros mergulhadores, talvez mais experientes que ele, mas esse empréstimo não lhe incomodava o espírito, pois que os interesses daquela alma encontravam-se com os seus, e, por mais que outras tantas características suas fossem encontrar abrigo nos braços de outros nadadores, haveria ela de considerar-se mais segura e à vontade com ele.
Dias e noites se seguiram e ele permaneceu feliz e realizado com sua poça semi-particular, já tendo, por sinal, alcançado maiores profundidades e, portanto, encontrado incontáveis tesouros. Era verdade que assumira outros compromissos e responsabilidades desde que a conhecera, mas ele sabia ser isso um reflexo do bem, da segurança e da auto-afirmação que lhe provera tão carinhosa alma, e portanto acreditava na estabilidade de seus interesses e afeições mútuos. Teve notícias de nadadores que a freqüentavam mais assiduamente com o passar do tempo, ousando outros estilos e profundidades, preenchendo as lacunas que seu tempo atribulado o impedia de ocupar. Não foi difícil, então, para ele, resolver diminuir seus outros compromissos e dedicar-se mais àquelas águas, e depois de nadar peito e borboleta e de descobrir um pouco mais de suas profundezas, pensou arriscar nadar costas, mas achou-se por demais pretencioso, pois que aquilo presumia que conhecia tão bem as águas por onde deslizava que já nem precisava ver por onde ia, e desistiu da tentativa. Ainda assim, as duas almas seguiram contentes, e ele cria naquele mar de reciprocidade tanto quanto cria que ela cria, mas jamais saberia se sim, mas não pensava jamais nisso, intentando deixá-la livre para o caso dela decidir mudar de interesses, no entanto não conferia a isso muita importância: convencia-se, mesmo que precipitadamente, de que permaneciam as duas almas atadas uma à outra como a nenhuma outra.
Mas a vida continuava a exigir dele e a requerer sua presença noutros lugares e a comer-lhe a disponibilidade de estar com aquela alma, aquela tão formosa alma, pois que no momento outras almas também precisavam da sua atenção, e ele havia de ocupar suas horas com coisas outras. Não era que não quisesse estar com ela, longe de si não querer estar com ela!, era simplesmente que não podia.
E eis que um dia, um nebuloso dia como há muito não havia, descobriu ele haver um outro mergulhador, um outro mergulhador em especial, que havia descoberto profundezas daquelas águas que ele próprio desconhecia, profundezas que desconhecia tão por completo, que desconhecia que desconhecia. Ele descobriu, espantado, que aquele mergulhador e a alma do calçadão, aquela alma que tanto lhe correspondera e aninhara, servindo da mais bela das casas, do mais seguro dos abrigos e do mais doce dos doces, aquele mergulhador e aquela alma amavam-se e encontravam-se tão cruamente, tão naturalmente, tão reciprocamente, que a ele não havia opção outra além de sentar-se e deslumbrar-se.
Aquele mergulhador, aquele interessante mergulhador, era por demasiado belo, especialmente por reconhecer sua própria feiura, e ele, sim, ele, nossa personagem principal, não soube o que fazer, pois que sentia que também poderia apaixonar-se por aquele mergulhador, mesmo que, a priori, não houvesse o mergulhador aparentado ser o tipo de poça na qual ele costumava mergulhar, mas o tipo de poça que era tão turva, tão lindamente turva, que era toda espelho, e ele, nossa personagem principal, jamais havia se deparado com algo que revelasse com tanta clareza, com tão feia e indecorosa clareza, sua própria imagem. Seu reflexo, desenhado naquelas águas, era tão nítido que mesmo a maior das ondas e turbulências eram incapazes de fazê-lo estremecer, e ele entendeu, então, porque era que aquela alma do calçadão o havia trocado.
Mas aquilo era absolutamente injusto, ele sabia. A alma do calçadão jamais o trocaria. E então ele entendeu, mais uma vez. Não era, ora, lógico que não era, que havia ele sido trocado, mas tanto quanto possibilitara -porque achava ser certo possibilitar-, a alma do calçadão havia encontrado no mergulhador uma forma diferente de aconchego e carinho, uma forma diferente de abrigo, a forma de aconchego, carinho e abrigo que precisava. No entanto ele sabia, sim, ele sabia!, que aquela forma de aconchego e abrigo também ele podia oferecer, se ao menos ele soubesse que era aquilo que ela queria, se ao menos ele tivesse tido tempo para dedicar-se e conhecê-la, se ao menos houvesse tempo, mas não havia. Não havia meios de estar mais presente, nem meios de deixar os compromissos dos quais tomara parte, não havia maneira de driblar tudo aquilo que ele precisava fazer no momento, não havia como contornar aquelas montanhas todas que o deixavam do outro lado da cidade, pois que ele infelizmente também não tinha carro.
E ele ficou em segundo lugar. Era a segunda figurinha predileta, a segunda música mais tocante, o segundo autor preferido, a segunda poça favorita. E a alma do calçadão lhe escrevia sempre que podia, mandando notícias e beijos, e ele ia lá nadar sempre que possível, mesmo que o sempre parecesse cada vez mais escasso, mas eles batalhavam os dois para que houvesse tempo, mesmo que não houvesse espaço. E era tempo que não havia mais que tudo, todo o resto permanecia lá.

10 de março de 2008

Mas nem uma delas me fez tão feliz quanto você me faz

Ela? Tem o espírito de um samba, tão puro e tão esperto, tão sutilmente armado para viciar-te à primeira nota. Tem a calma das vozes dos cantores de bossa e o veneno de olhos de criança, culpados de te enfeitiçarem apesar da malandragem, por vezes pela malandragem. Deus, astuto, fez seus cabelos cacheados para fazer encontrar-se nela todas as formas de ludibriar os corações fracos de seus pobres mortais. Fez seus olhos vivos para matar-nos. Fez sua boca de tal tamanho e formato que tocamos as nossas para imaginarmo-nos tocando a sua. E a indústria fez perfumes para sabermos que seu aroma é natural. Ela traz labirintos nas saias rodadas e roda-nos sem precisar nos tocar. Ela nunca usa saltos, somente sandálias. Ela dorme sobre meus cabelos e se queixa do meu queixo, dizendo que queria uma menina. Ela mexe nas minhas roupas enquanto finge ajeitá-las, e descobre onde estive noite passada sem eu ter saído de casa. Ela me chama de Caim enquanto grita outras coisas inomináveis, mas sonha com Abel enquanto dorme nos meus braços. Ela me surpreende em dias dos namorados sem eu sequer saber que se considera a minha. Ela pinta o cabelo para que eu não a reconheça entre outras volúpias, ela pensa em fugir. Ela me prende para que eu não vá, e passa minhas camisas pela manhã. Reclama de seu cabelo liso como se o quisesse cacheado, diz que nele nada prende, sem saber que prende a mim. Ela tem o espírito como de um pagode, maliciosa e agitada, dançando para todos da roda, mas cantando que me ama. Ela não passa maquiagem no rosto por saber da beleza natural, e nos enfeitiça por nunca estar menos bonita. Ela usa tênis ou sapatos baixos, sempre. Ela dorme de lado, mas odeia conchinha, e me empurra até fazer da cama quase que somente sua. Ela não grita meu nome, nem coisas inomináveis nunca, mas abre os olhos como se me engolisse, e me engole. Ela não me pergunta onde vou e a que horas chego, nem se cheiro a outras saias. Ela não usa saias. Ela me ama antes como amante que como pessoa. Ela tem os cabelos a morrer no ombros, e eu a morrer em suas pernas expostas, nunca cobertas, ela recusa calças. Nunca tingiu o cabelo, nem mudou de shampoo, nunca saiu de casa, nem gosta de festas. Canta seus hinos no banho e me prende por me deixar livre. Ela tem a alma de um fado, grudada às cartas de amantes passados sem os amar, talvez por não os amar mais. Chora sozinha no quarto e recusa-se a falar comigo mesmo que eu lhe dê flores, ela odeia flores especialmente por adorá-las. Depois ri de si e me convida para o cobertor, e até vê meus filmes preferidos. Ela usa óculos de grau e escreve com a esquerda, mas toca violão como se fosse destra. Ela canta as músicas de criança e dos tempos moços de seus pais e risca meus cds de rock quando não estou olhando e põe a culpa no meu desleixo de deixá-los espalhados. Ela decide minhas roupas e meus destinos, e não me deixa falar a ponto de me convencer que nunca fui contra suas idéias. Ela me olha de lado mais para me conquistar que para repreender. Ela me prende por me esquecer. Ela me cheira o cangote e depois vai dormir, como se eu fosse apenas um mau hábito. Ela parece uma canção de ninar. Tem os dedos finos e o rosto puro, mas me mata se estamos sós. Ela se cansa de arranhar-me como se ninguém mais me fosse ver, e ignora que não uso sempre golas altas. Ela me rabisca afrescos, para que eu jamais me livre de si. Ela espera que eu termine todas as frases até o último ponto e sempre reforça o quanto me estima, para que eu saiba que sou uma opção sua. Ela me ama antes como pessoa que como amante. Ela não bebe e não gosta do gosto em minha boca, e me beija como se não o sentisse. Ela usa saltos para se impor, mas faz estragos de chinelo. Ela usa perfumes variados, como que para ser diferente todos os dias. Ela usa preto no Natal, no Ano Novo, na Páscoa e em qualquer outro dia do ano. Ela é como um rock. Ela bate-me por dentro, por fora, estoura-me os tímpanos com revoltas e a alma com pessoalidades, e me extasia só de me olhar. Ela não me ama. Ela dança de olhos fechados como se se perdesse por se encontrar. Ela dança de olhos apertados quando ouve o refrão e sorri quando acha que não lhe estão vendo. Ela se risca, se rabisca, e por vezes sai sangue. Por vezes escreve em sangue no banheiro, nas paredes, em mim. Faz-me sangrar por não querer fazer-se. Ela pinta as unhas, mas nunca de preto, diz trazer maus espíritos. Ela lê a Bíblia antes de dormir e me puxa na cama se estou longe demais. Ela me faz café e erra sempre a quantidade de açúcar. Ela me escreve poemas e ignora que prefiro prosa. Ela me ama mais que a si. Ela não joga xadrez, mas o usa como enfeite na minha estante de canecas. Ela tem a alma de música clássica, e a maior parte dos poucos que a entendem a venera. Ela fala pouco, mas faz-se entender com gemidos. Ela lê para que eu durma e para que acorde. Ela nunca me traz café na cama, e finge-se surpreendia quando recebe. Ela usa lentes para ler e para mudar a cor dos olhos. Ela não vai ao cinema só, mas às vezes às festas vai, e por voltar cheirando a tudo, não cheiro nada. Ela deita, dorme e sonha comigo mesmo depois de gritar meu nome, e às vezes dá a entender que vai ficar, outras que vai partir, e deixa para decidir no dia seguinte.

Complementando sem permissão

O tombo era certo, mas também houve prazer.

4 de março de 2008

Hoje é o dia do anônimo

Utilizem os comentários.
(hoje então também pode ser o dia da expiação)
(vou deixar esse post durar uma semana)
(sintam-se em casa, sem espelhos)

Posso também escrever em papel

Okay, now, let's be serious.
Eu preciso dar valor à minha escrita. Não, não é que a ache ruim, não é, não. É que eu não dou importância suficiente ou seriedade suficiente à importância que a escrita tem pra mim, ao valor que a escrita tem no geral. Eu não resolvo sentar um dia em frente ao computador e colocar para fora todas as Márcias, Robertas, Personagens-Sem-Nome e outras pessoas que seriamente vivem suas vidas paralelas na minha mente. Até resolvo, e paro!, mas daí a poha do bonequinho do msn começa a rodar, rodar, rodar e poha, quem mandou ele rodar?! (Fui eu; meu msn não entra automático...) Daí pronto, x, y e z estão online, daí o orkut é tentador, daí passa um filme interessante na televisão, daí Roberta está dormindo e se recusa a levantar da cama para viver a vida que quero fazê-la viver. Não, sério, eu preciso levar isso a sério. Ainda assim, reluto a começar um "projeto laptop" por diversos motivos:
- uma vez projeto, deverá ser levado para frente, e isso super me consumiria exatamente pelo fato de eu não poder consumir minhas economias pobres de mesadas mais altas do que eu mereço receber;
- eu posso escrever em papel; pra que diabos laptop?;
- será que isso de fato me faria escrever e dedicar-me mais?;
- eu posso escrever em papel; pra que diabos laptop?;
- eu posso escrever em papel; pra que diabos laptop?;
- laptop é comodismo, modismo e uma preocupação a mais (eu sou por demais descuidada).
Daí também eu penso que talvez não esteja preparada para escrever seriamente. Quer dizer, talvez uma coisa aqui, outra ali, uma meia história, um rascunho. Mas história a sério? Argh, vai ser punk. E comecei tantas já! Está certo que essa parece particularmente interessante e parece estar vingando, mas. Preciso de estímulo. Também como é que funciona esse "escrever"? Tipo, você senta em frente ao caderno/máquina de escrever/computador/laptop e rala seu cérebro e sua imaginação e seu português para arranjar algo que soe bem? Você fica meia hora maquinando pra ver se alguma coisa que preste saia da sua cabeça e seja materializada com eficiência? Maldita tara pela escrita! Maldita satisfação na escrita! Maldita crença na escrita!
Okay, vou tentar (mais uma vez).

hê!

Adoro quando falam em filmes:
- Uuh, troubles in paradise?

Sobre o raso

"Ainda vamos brigar por ela" foi mesmo uma jogada de mestre, mesmo que o objetivo não tenha sido a ambigüidade que eu vi.
Aliás, eu vejo muita coisa onde não tem.

3 de março de 2008

Sobre o maldito papel sumido, o momento que escrevi nele, a razão, a escolha de não o ter jogado fora quando pude, o saber de que não o jogarei

Perdi pela casa algo que ninguém pode achar.
E-AGORA?!
Eu jurava que estava naquela gaveta!

2 de março de 2008

Calando o resto

Não vou me calar, não vou me calar. Não vou dar brechas para o silêncio e o barulho das águas do lago, nem vou dar-lhe tempo para observar o que há ao redor ou para escutar tudo mais que nos envolve. Não vou calar, não me vou calar, para não lhe dar o tempo de ouvir a si mesmo e ir embora antes que eu lhe ame.