22 de novembro de 2013

Lua!, desde quando - eu lhe dizia - fazes assim? Em quase tom de raiva, interno tom de amor profundo, pôs-se a garota sentada sem opções junto ao meio-fio. O fio havia-se cortado em uma linha de poste já tão alta, assim devendo ser como aquelas onde se penduram as bolotas que avisam aos helicópteros que o céu não está seguro. Havia escrito uma carta longuíssima de muito poucas palavras, dobrou num formato que voava, prendeu linha e carretel e pôs-se atrás dela, tendo-a observado por muito subir aos céus, donde nunca descia. O nó que fazia a junção das suas sobrancelhas consternadas era o mesmo sulco que fazia o cotovelo no joelho, indignados. Passou um rapazote, mais moço, que vendo o carretel em desuso perguntou-lhe se podia ser seu. Pode, mas as pipas nem sobem muito. Levou o carretel e com muito apreço prendeu-o ao corpo de uma pipa muito recém feita que mantinha em casa. Havia nela escrito uma carta endereçada ao sol, e ao vê-lo subir aos céus donde nunca descia numa bela manhã, armou-se de empiná-la até onde fosse. Foi empinando, empinando, até que ela era só um pontinho bem alto. A moça, passando ali, sentou-se do lado dele a desfiar conversas curiosas e desinteressadas até que veio descendo a linha do carretel frouxinha. Ele sentindo o fio leve, levantou-se de sobressalto, olhou o sol já quente, como nunca deixava de ser, e veio enrolando apressado a corda. Eu lhe disse, a moça, que não sobem tanto e logo quando pensamos que já quase lá estão, desistem. Não!, ela chegou! Veja a pontinha queimada! Verdade, o nylon derretido e o rapaz satisfeito foram caminhando a caminho de casa seguidos da moça, muda até que encucou por que será que a dela não tinha chegado. O menino olhou-a, deu-lhe o carretel de volta, disse que tinha que atrai-la, na minha fiz uma aleluia. Corri direto pra casa, arquitetando construir uma pipa com buraco praquele coelho não me resistir.
Segue a solidão o curso de sua novela. Tranquila com o espaço que confere a si mesma, observa entretanto como este mesmo lânguido espaço vai-se transformando numa coisa à parte, assume sua postura diante do universo, e perdura a despeito das intenções solitárias de terminarem-se. Sem a companhia, quê seria da solidão? Que opções encontraria de ser-se? Como do mesmo modo é a ausência quem define a presença, também a solidão mantém seus romances com as companhias que pode ser que venha a ter, que poderia... Estas contudo esvaziadas, quê lhe resta de si mesma? Em que momento construir-se, estar-se e ser tercerizou-se, enfim? Em que momento ao optar já não optava, ao ser, já nem era. Olhando-se no espelho, tás cinza, a descobrir se as combinações de branco e preto encontram-se de fato em cinquenta por cento cinquenta por cento, ou afinal quem é? Observa-se. Perde-se o objetivo, absorvido por qualquer neurônio esfomeado, e em seu lugar sobrepõe-se outra questão. Toca-se, mão na mão, no espelho. Enamoramento impossível. Muito embora reconheça as próprias formas, compreenda retroativamente os comentários que por aí ouviu de si, e se veja, não consegue tocar-se ao se ver como outra. Apenas se se observar de cima, quando o rosto não vê o pescoço, quando nem o próprio rosto se vê, apenas se for quem é é que consegue sentir na pele a própria pele. E assim caminha, sorrateira e duvidosa, a tentar entender donde vem entender

14 de novembro de 2013

NGC 1097 reluz a 45 milhões de anos-luz daqui, espiralada e tonta, independente galáxia nos céus do sul, mergulhada na constelação de Fornax. Lá longe, será que esbarra a consciência que perco todos os dias por força de tornar evidentes apenas as nebulosas das minhas sensações, ao invés da minha razão humana? Ou será que a própria galáxia, vista assim, de um jeito que ela mesma não se vê, inventa o retrato geral de sua situação? Será que um tal espelho, as ousadias do telescópio Hubble, não fazem imaginar aos nossos olhos a bidimensionalidade do que não sabemos? De todo modo, o giro confuso de NGC 1097 produz nas minhas perspectivas a incredulidade do seu desenho exageradamente universal. Fico eu girando também, contida no maciço buraco negro escondido no centro, bem no meio da afetividade exagerada que a sua ilusão causa. Enigmática, como lhe chamam os astrofísicos, confundo do que dizem ao flutuar, inevitável na inércia espacial, em direção àquela outra, num paralelo universal da forma que eu não deveria fazer. Como pode a percepção enganar-se entre gramaturas tão diferentes? É a ilusão de a textura da galáxia poder parecer com a sua pele adimensional que traz uma coisa à outra.
Voa o pensamento. Como mãe não, mas como amante convencional tento dizer-lhe para onde deve ir, onde deve ficar, o que não fazer, de que jeito me gostar. Segue o pensamento... sem ordens nem respeito conduz-me mais uma vez às instâncias que deixo esquecer; sendo duas, observo-o a descobrir-se em paragens que eu mesma já conheço, trejeitos seus - de você - tão atraentes em cujas armadilhas já caí com outras partes de mim. Porém ele segue, infantil, deleitado em tantas coisas que julga novidades, inventa desejos, e quando por alguma viela se depara com aqueles já maduros que foram um tanto mais adiante no caminho, intimida-se, bem faz ele, recua suave, tentando-se impercebido, rumando a novos desafios. Vai pensando e eu deixo-o pensar, porque esta é sua função e ele é tão moço, ainda tantas coisas lhe provarão como é imaturo, como está errado, como faz alvoroço onde poderia apenas observar. Constante criança, birrenta com as outras, revoltada em si para provar a revolta, insistente para provar a insistência, para ser chata. Leniente consigo mesmo, deixa-se demorar a aprender, e eu deixo-o, porque ele é assim.

10 de novembro de 2013

Agora você já foi. Isso digo porque, me pondo em batalha, se perder eu é que ganho. Você sabe, e eu te olho, para não deixar a dúvida te misturar as ideias bestas. Danço, sim, os seus poros. Quero-te, fugaz!, para inventar novas formas de você querer. Você quer. O que te faz de difícil é uma artimanha que vou deixar você fazer, pode fazer. Estou cedida, você sabe, até quando eu atacar. Pois aqui valerá a briga de um desejo erótico e pessoal,
Não sou eu que escolho, vês, a zona que tu faz. Não te permito nada, ai se você soubesse. Não te dou nenhum aval. E mexes, estás me remexendo, vejo que encosta, gostosa, suas costas na almofada a me ver passar a noite     em claro. Vês-me, então veja. Vai lotar a esplanada das suas misteriosidades. Pirarás o desejo noite adentro, pode me desgostar. Eu te arranho, e desejo, até mudares de ideia.

6 de novembro de 2013

Eu ouço, reescuto, o que você diz, o que você faz, a simplicidade da curva esgotando-se em si mesma. Eu rascunho, rabisco, desdecoro e surpreendo, em voltas incontroláveis, os 360º de corpo que você tem. Arrisco o padrão do lançamento, vejo-me enfurnada na boca do canhão, e rindo! do que não sei ao lhe observar pelo buraco negro por onde sairei a toda prova, em segundos, vários, quando o ambiente externo esquentar minha fagulha.