10 de dezembro de 2008

Nem leucemia nem planos cabíveis

Todo mundo sofre, e você estrategicamente posicionado para tirar-lhes a foto no momento do descanso. Daí também, e nada mais faz sentido, vai caminhando sem propósito para o depósito de lixo mais próximo e atira-se na esperança de expiação. Ninguém volta, ninguém te quer entre os mais queridos da turma e os primeiros escolhidos do time de futebol ou do medley de natação. Ninguém te quer. Você vai dormir e chora pela foto que bateu no momento de descanso do atleta mais sofrido do colégio e, embora a foto tenha sido de puro caráter artístico, você argumenta, ninguém vai gostar dela, ela é do momento mais suave das cinco horas de corrida do menino de doze anos com leucemia. Você pára, você olha, também você podia ser leucêmico e acho que então a foto valeria, você tem quatorze e ainda usa mamadeira e ninguém sabe e então já é lucro e você é disléxico e sozinho, mas não tem leucemia. O câncer mata e é trágico, é chato, é triste. Você não fuma, nem bebe, mas gostaria. Cada trago que dá sozinho no box mais mocado do banheiro pensa que é uma injeção de células tortas, mas e sem saber o porquê, traga mais uma vez. Sua família é católica apostólica romana, ortodoxa, dedicada, praticante, submissa, unida, amorosa, amante da medicina, da advocacia, da tradição e de todas as profissões que lhe trarão dinheiro e status. E de você, é claro. Você terá sucesso, mulher, filhos, casa, carro, aplicações e posses. Como assim você não quer? Você terá sucesso, mulher, filhos, casa, carros e aplicações. Sim, obrigada. Enfim, vai dormir, vai, coloca as idéias em mente e amanhã vem nos encontrar no almoço do jeitinho certo, como tudo deve ser., ok.

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