Há múltiplos motivos para que haja um encontro de carnes. Desgosto de quem nomeia o Amor como a única causa dele, ou quem se considera compreensivo - ou moderninho, como diriam nossas mães -, e dá igual relevância ao tesão, mas a nada mais. Mas o Amor é ainda mais puro, o Amor é nosso auge maior, o Amor é o que não alcançaremos por nossa desconcertante e inconcertável podridão. O Amor é Deus. Mas é por ser Deus que o Amor é inevitavelmente dissimulado, ela queria fazer seu ponto, e vice-versa. O Amor é tão dissimulado que sequer ama. Não, nós amamos, ou genuinamente tentamos, mas o Amor é quem é mais esperto. Nós nos multiplicamos e desdobramos e matamos e dizemos que jamais aprenderemos a amar. Mas o Amor só é chamado Amor por não amar(!). O Amor é uma popstar que dá festas de madrugada em suas mansões de luxo. Nós dormimos cedo para o trabalho do dia seguinte e reconhecemos nossa inferioridade e sabemos que não sabemos e jamais saberemos amar como o Amor. Jamais conseguiremos abraçar o Amor, jamais seremos puros o suficiente para o Amor. Mas o Amor é um homem que responde pelo nome de Don Juan. E nós somos os ingratos que nos envolvemos com redes de prostituição mesmo que tenhamos mulher e filhos. Somos um escândalo e atendemos pelo nome de Bill Clinton. Mas o Amor é o vigarista desfarçado que vende rosas a cinco reais no dia dos namorados e grita que é promoção. Nós somos o cuspe de Deus e o beijo do Diabo; nós somos o cigarro que rola pelo chão da auto-estrada, e o Amor, em seu trono é o boquete da donzela cujo cigarro agora morre sem ar no asfalto quente. Nós somos a moeda jogada do carro para a criança que tapa buracos e o Amor é a roda que lhe joga poeira. Nós somos as bocas abertas e os corpos prostrados e o Amor, com sua sabedoria, o Amor são nossas línguas e mãos. Agora, lhe digo, há inúmeros motivos para um encontro de corpos. Há nossa curiosidade, nossa ruidosidade, nossa amizade e mais ainda nossa idade. Há nosso costume, nosso ciúme, nosso estrume. Nosso ócio, nosso bócio, mais ainda nosso negócio. Há nossa inércia, nossa modéstia e principalmente nossa amnésia. Há nossa mescla, nossa conversa, nossa festa. Nossa histeria, nossa fantasia, um brinde à nossa hipocrisia. Há nossa malandragem, nossa sacanagem, eternamente nossa personagem. Nosso furor, nosso torpor, ode ao nosso rancor. Há nosso desvio, tudo aquilo que é hostil, ainda mais nosso cio. Nosso prazer, nosso romper, nossa vontade de (não) ser. Há nossa doença, nossa descrença, nossa impiedosa sentença. Há nossa mania, nossa agonia, mais ainda nossa orgia. Nosso tesão, nossa fração, nossa ausência de razão. Há nosso choque, nosso enfoque, nosso sempre renovado estoque. Nosso esporte. - Continuaremos a fazer brigas com nossos corpos porque descobrimos o segredo do Amor, e jogamos no seu time.
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