Engatinha, sobre mim, a extensão da sua vontade. Nem imagino o que vem ao meu encontro. Não consigo imaginar nada. Ela vem, gigante, sobre mim, e eu lambo o seu desejo por todos os lados. Ela me procura, olha, investiga, metade interessada no que está por vir, metade entregue, e curiosa. Molha-se toda, em mim, sem mim, mal me vê; olha-me, contudo, se vendo em prazer, inventando mil e um acontecimentos para os segundos seguintes, enquanto sobe, monta, lentamente, em mim. Em mim, a curva imensa de um quadril se assoma, o formato inteiro da minha culpa, mulher morena vingativa do meu querer.
Entrou sem mistério pela porta, em uma conversa besta, descompromissada, propostas. Olho-a, não vejo nada do que acontece. Estou retomando as mil e uma criatividades que tive com ela gemendo, com ela se arrastando em mim, ideias soltas que tive em uma fila, uma parada de ônibus, no self-service, no tropeço no meio da rua, na sombra quente deste dia frio. Ela, na minha frente, segue inventando muitas palavras e a sua boca se mexe como a minha, como são parecidas, o seu queixo tem um vinco contra o qual pressiono meu vinco. Embora ela saiba e não diga, e em breve vá chamar minha atenção, não sei qual assunto ela elabora neste momento. E então, concluindo seu monólogo, encosta com a suspiração dos dedos a pele do meu braço, chuta a ponta do meu pé esquerdo e se espreme entre as minhas quatro paredes - parece que não vai caber no hall da sala. Os quadros todos despencam gradual e coletivamente, tudo dela vira o buraco negro do olho, no qual me perco, e só desperto muito depois sem me lembrar de nada, e esta memória abstrata me encontra de súbito na fila do ônibus a confundir-me se é apenas mais uma imaginação.
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