1 de novembro de 2009

na chegada no colchão

Ah, se me causasse na alma menos que esse transbordo, menos que esse excesso de uma consciência prematura e inimiga. Ah, se soubesse descansar como descanso em seus braços que não me querem. A generosidade do meu lado que confere calma e as boas mentiras dos banheiros públicos. Busquei em Josué carinho e em Carlos Drumond de Andrade mais que um abstracionismo que não enche barriga. Busquei em Maria Aparecida que aparecesse.
O mar é um vômito da noite. De manhã ressaca e mata. O mar é a língua da noite, e seus cabelos tão arrumados...
E perdi, por fim, o fundo raso da minha tranquilidade. Não estou tranquila, não sou, mais, tranquila. Tudo agora me é resto. Tudo que consigo, agora, me é resto. Vejo a mancha caminhar o xote da minha incapacidade. Os olhos enamorados das circunstâncias me desprezam, e eu, menosprezada, olho. Todos os corpos são azuis, e são inchados, e vão morrer. Mas eu não vejo assim. Vejo um som grosso e burro ao redor das coisas, não ouço mais nada. Tudo é um rumorar distante ou um desinteresse ruidoso. Tenho tédio, minha ação se chama tédio, até a própria disposição, é tédio.
Não tenho sequer um interesse na dança dos corpos. Tenho preguiça em pensar em atos sexuais, e quando penso, preguiça de pensar executá-los. O miar do gato é pura malcriação e eu quero dois copos de pinga. Duas doses. As palavras agora formam desenhos além de serem só nomes, e eu estou sozinha sem os erros da sua interpretação enviesada.
Eu não só quero que você me queira, eu quero ficar sozinha em casa. Só hoje reparei que estar arruinado é ser ruínas, e invejei com todas as forças a perfeição desse senso estético. O ciclo completo de ser ruínas. Picasso inveja. Mas não precisa se preocupar: todos os seus críticos lhe dirão ruínas mesmo sem que o seja, porque o bom da fama - e da infâmia - é poder ser tudo sem ser nada.
Quando mamãe me disse que papai morreu, pensei logo em ser advogado para ficar, além da minha parte, com a dos serviços da lei. Antônio, disse seu-moço da fazenda, tem quê de se apoquentar não que eu já tô indo. E dormiu com a varinha na mão.

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